O epicurismo e outros saberes
“Aquele que inspira medo aos outros não está, ele
próprio, livre desse medo.” (Epicuro)
- As correntes filosóficas desse período surgem como tentativas de
remediar os sofrimentos da condição humana individual.
A - O epicurismo ensinando que o prazer é o sentido da vida:
- Para o epicurismo, a felicidade é o prazer, mas o verdadeiro prazer é
aquele proporcionado pela ausência de sofrimentos do corpo e de perturbações da
alma.
- Para Epicuro, não se deve temer a morte, porque nada é para nós
enquanto vivemos e, quando ela nos sobrevém, somos nós que deixamos de ser.
B - O estoicismo instruindo a suportar com a mesma firmeza de
caráter os acontecimentos bons ou maus:
- Os estoicos, acreditando na ideia de um cosmo harmonioso governado por
uma razão universal, afirmaram que virtuoso e feliz é o homem que vive de acordo
com a natureza e a razão.
- Conforme a moral estoica, nossos juízos e paixões dependem de nós, e a
importância das coisas provém da opinião que delas temos.
C - o ceticismo de Pirro orientando
a suspender os julgamentos sobre os fenômenos:
- O ceticismo de Pirro sustentou que, porque todas as opiniões são
igualmente válidas e nossas sensações não são verdadeiras nem falsas, nada se
deve afirmar com certeza absoluta, e da suspensão do juízo advém à paz e a
tranquilidade da alma.
Fragmento 2 – Segundo a filosofia de Epicuro para sermos felizes, o essencial é o
que se passa em nosso interior, pois é deste que nós somos donos.
“O mundo me condena, e ninguém tem pena
Falando sempre mal do meu nome
Deixando de saber se eu vou morrer de sede
Ou se vou morrer de fome
Mas a filosofia hoje me auxilia
A viver indiferente assim
Nesta prontidão sem fim
Vou fingindo que sou rico
Pra ninguém zombar de mim
Não me incomodo que você me diga
Que a sociedade é minha inimiga
Pois cantando neste mundo
Vivo escravo do meu samba, muito embora vagabundo
Quanto a você da aristocracia
Que tem dinheiro, mas não compra alegria
Há de viver eternamente sendo escrava dessa gente
Que cultiva hipocrisia.” (Noel Rosa)
Fragmento 3 - De forma resumida, a doutrina de Epicuro é uma filosofia do prazer.
Achar o caminho de maior felicidade e tranquilidade, evitando a dor, era a
máxima epicurista. No entanto, não se trata da busca de qualquer prazer, que é
evidente na canção de Noel Rosa quando exalta sua vida de sambista e nela encontrar
indiferença para os que vivem em função do “dinheiro que não compra alegria”.
Para Epicuro, a música era um dos prazeres no qual o ser humano ao encontrar,
não devia jamais se separar. Epicuro não faz uma defesa do carpe diem ou
da libertinagem irresponsável. O prazer em questão não é nunca trivial ou
vulgar. Na carta a Meneceu, Epicuro afirma que “nem todo o prazer é digno de
ser desejado”, da mesma forma que nem toda dor deve ser evitada
incondicionalmente. A deturpação do conceito de prazer usado por Epicuro foi
algo que ocorreu durante a sua vida, e ele teve, portanto, a oportunidade de
rebater: “Quando dizemos então, que o prazer é a finalidade da nossa vida,
não queremos referir-nos aos prazeres dos gozadores dissolutos, para os quais o
alvo é o gozo em si. É isso que creem os ignorantes ou aqueles que não
compreendem a nossa doutrina ou querem, maldosamente, não entender a sua
verdade. Para nós, prazer significa: não ter dores no âmbito físico e não
sentir falta de serenidade no âmbito da alma”. Em outras palavras, a
ataraxia, a quietude, a ausência de dor, a serenidade e a imperturbabilidade da
alma.
Fragmento 4 - “Acostuma-te à ideia de que a morte para nós não é nada, visto que
todo bem e todo mal residem nas sensações, e a morte é justamente a privação
das sensações. A consciência clara de que a morte não significa nada para nós
proporciona a fruição da vida efêmera, sem querer acrescentar-lhe tempo
infinito e eliminando o desejo de imortalidade. Não existe nada de terrível na
vida para quem está perfeitamente convencido de que não há nada de terrível em
deixar de viver. É tolo, portanto, quem diz ter medo da morte, não porque a
chegada desta lhe trará sofrimento, mas porque o aflige a própria espera.”
(Epicuro, Carta sobre a felicidade [a Meneceu]. São Paulo: ed. Unesp,
2002, p. 27. In: COTRIM, G. Fundamentos da Filosofia. SP: Saraiva, 2006,
p. 97).
Fragmento 5 - Para
Epicuro, não devemos temer a morte, pois, enquanto vivemos, a morte está
ausente e quando ela for presente nós não seremos mais; portanto, a vida e a
morte não podem encontrar-se. Devemos exorcizar todo temor da morte e sermos
capazes de gozar a finitude da nossa vida.
Fragmento 6 - O pensamento de
Epicuro é marcado pela identificação do bem soberano com o prazer, todavia não
se pode derivar dessa relação à liberação para uma vida dos prazeres. Os
epicuristas determinavam que a felicidade se encontra em uma vida regrada
definida segundo uma inteligência prática capaz de ter as paixões como normais,
e não como inimigas.
Fragmento 7 - Os deuses
de fato existem e é evidente o conhecimento que temos deles; já a imagem que
deles faz a maioria das pessoas, essa não existe: as pessoas não costumam
preservar a noção que têm dos deuses. Ímpio não é quem rejeita os deuses em que
a maioria crê, mas sim quem atribui aos deuses os falsos juízos dessa maioria.
Com efeito, os juízos do povo a respeito dos deuses não se baseiam em noções
inatas, mas em opiniões falsas. Daí a crença de que eles causam os maiores
malefícios aos maus e os maiores benefícios aos bons. Irmanados pelas suas
próprias virtudes, eles só aceitam a convivência com os seus semelhantes e
consideram estranho tudo que seja diferente deles.
EPICURO. Carta sobre a felicidade (a Meneceu). Trad. de A.
Lorencini e E. del Carratore. São Paulo: Editora da UNESP, 2002. p. 25-27.
Fragmento 8 - Segundo a
filosofia epicurista, o homem chega à felicidade por meio da ataraxia, que
corresponde ao estado de tranquilidade da alma. Tal estado só é possível de ser
alcançado se os homens deixam de temer a morte e os deuses. Uma vez que os
deuses são indiferentes aos homens e existem somente em uma dimensão que não
pode influenciá-los, a falsa crença de que os deuses “causam os maiores
malefícios aos maus e os maiores benefícios aos bons” cria no homem um estado
de angústia, que o impede de chegar à ataraxia.
Fragmento 9 - “(...) o prazer é o começo e o fim da vida feliz. É ele que
reconhecemos como o bem primitivo e natural e é a partir dele que se determinam
toda escolha e toda recusa e é a ele que retornamos sempre, medindo todos os
bens pelo cânon do sentimento. Exatamente porque o prazer é o bem primitivo e
natural, não escolhemos todo e qualquer prazer; podemos mesmo deixar de lado
muitos prazeres quando é maior o incômodo que os segue.”
(EPICURO, A vida feliz. In: ARANHA, M. L.; MARTINS, M. P. Temas de
filosofia. 3.ª ed. rev. São Paulo: Moderna, 2005, p. 228.)
Fragmento 10 - “De fato, prazer e dor são
sensações e por isso são maneiras de conhecer. E porque são sensações, para
ambos valem todas as afirmações feitas a respeito da sensação: são causados por
objetos que afetam o corpo; são sempre verdadeiros; dependem das condições do
corpo que afeta e daquelas de nosso corpo ao ser afetado etc. Sua
peculiaridade, entretanto, decorre do fato de que sua passividade é inseparável
da atividade. Em outras palavras, efeitos de causas externas, prazer e dor
também operam como causas, pois além de discriminar as coisas que nos afetam
são ainda uma ação de escolha ou de rejeição delas, São critério ou regra de
nossa conduta.Com eles, a canônica se articula à ética”.
(CHAUÍ, M. Introdução à história
da filosofia, vol. 2: as escolas helenísticas. São Paulo: Companhia das
Letras, 2010, p. 96)
Fragmento 11 - Há de se ressaltar que não é o prazer que gera a dor, porém certos
objetos que nos afetam de maneira prazerosa podem, de acordo com o tipo de
afecção, ser dolorosos.
Fragmento 12 - “Ao instaurar a ruptura entre mythos [mito]
e lógos [razão], a cultura ocidental provocou um acontecimento desconhecido
em outras culturas: o conflito entre a fé e a razão, que se manifestou
desde muito cedo, já na Grécia antiga”
(CHAUI, Marilena. Convite à
filosofia. São Paulo: Editora Ática, 2011. p.332).
Fragmento 13 - Sobre as difíceis relações entre fé e razão:
A - Para enfrentar os questionamentos que a filosofia,
através da razão, impõe à fé, a religião elabora uma ciência do conhecimento de
Deus, isto é, a teologia, segundo a qual o conhecimento de Deus ocorre por meio
da razão.
B - Epicuro considerou que a religião não passa de uma fabulação
ilusória que os homens criaram por medo da morte e das forças da natureza.
C - Santo Agostinho considera a fé e a graça como os únicos meios
de aproximar-se de Deus, mas não condena a teologia pela prepotência em querer
conhecê-lo através da razão também.
D – Santo Tomás de Aquino elabora as Cinco Vias, calcada no
conceito de Primeiro Motor de Aristóteles, onde ele apresenta, de forma
racional, a divindade (Deus) como causa inicial e final de todas as coisas
existentes.
E - O deísmo é uma reação à religião revelada. Afirma a existência de
um Deus, cujo caráter é uma força, uma energia inteligente, imanente à natureza
e que pode ser conhecido pela razão.
F - Ludwig Feuerbach considerou a religião como uma expressão da
essência transcendental do homem, todavia, condenou a teologia que, segundo
ele, deve ser substituída por uma antropologia da religião.
G – Karl Marx concluiu que a religião é o ópio do povo.
Fragmento 14 - A filosofia de
Epicuro pode ser caracterizada por uma filosofia da natureza e uma antropologia
materialista; por uma ética fundamentada na amizade e a busca da felicidade nos
princípios de autarquia (autonomia e independência do sujeito) e de ataraxia
(serenidade, ausência de perturbação, de inquietação da mente).
Fragmento 15 - A filosofia de Epicuro fundamenta-se no atomismo de Demócrito.
Epicuro acredita que a alma humana é formada de um agrupamento de átomos que se
desagregam depois da morte, mas que não se extinguem, pois são eternos, podendo
reagrupar-se infinitamente.
Fragmento 16 - “Embora esses dogmas pertençam à religião, os utopianos pensam que a
razão pode induzir, por si mesma, a crer neles e aceitá-los. Não hesitam em
declarar que, na ausência desses princípios, fora preciso ser estúpido para não
procurar o prazer por todos os meios possíveis, criminosos ou legítimos. A
virtude consistiria, então, em escolher, entre duas volúpias, a mais deliciosa,
a mais picante; e em fugir dos prazeres que se seguissem dores mais vivas do
que o gozo que tivessem proporcionado”
(MORE, Thomas. A
utopia. Trad. Luis de Andrade, São Paulo: Nova Cultural, 1988. Col. Os Pensadores)
Fragmento 17 - A questão sobre a natureza da felicidade humana e a possibilidade de
sua realização é uma das principais questões estudadas pela filosofia grega
antiga, sendo discutida no interior de uma ética e relacionada a noções de
virtude e de justiça. Sabe-se que uma das características principais do
humanismo, presente no pensamento renascentista, é justamente a releitura dos
filósofos antigos, buscando integra-los a concepção cristã de vida. A concepção
ética do povo utopiano, descrita na obra A
utopia, de Thomas More pode ser considerada, em suas linhas gerais, uma revalorização
de que corrente filosófica grega?
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