sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

O INFERNO SÃO OS OUTROS



(Ensaio sobre as vicissitudes humanas) 

Por: Claudio Fernando Ramos – Natal-RN, 25/01/2013. Cacau “:¬)

“Uniu dois mundos em vidas tão separadas
Juntou caminhos, mas separou as estradas”.
(Nana Caymmi: Dois Corações)


A exteriorização de nossas subjetividades. Cacau ":¬)


Se no passado o grande mistério a ser desvendado, residia na impossibilidade de saber o que havia após a, imaginária, linha do horizonte; hoje, essa dificuldade transferiu-se para o espaço. Saber se o universo surgiu ou foi criado; se é finito ou infinito; se está em provável expansão ou em improvável retração; se nele existem água, vida e inteligência, além do que já conhecemos no interior do planeta terra, constitui incógnitas ainda insolúveis. Porém, essas proposições não devem ser essencialmente encaradas como problemas, mas, sim, como desafios propostos a arguta curiosidade humana. Desafios que, em um futuro próximo ou distante, podem vir ou não a serem desvendados. Problemas, de fato, temos quando o assunto é: como ser bem sucedido nas relações humanas?

Internamente somos, posivelmente, tão vastos como o universo. Cacau ":¬)


Por mais explicito, extenso, prolixo e profundo que se apresentem, não há livros, artigos, ensaios, teses...; que possam em um só fôlego ou mais, esgotar o assunto (os livros de autoajuda bem que tentam). Sabedores dessa verdade, pretendemos ao longo de vários ensaios como este, prestar, na medida do possível, algumas humildes contribuições ao tema; tendo como objetivo a minimização dos inevitáveis conflitos pessoais e, se possível, o enriquecimento, desse insondável universo da subjetividade humana. 


Uma doença deve sempre ser encarada como algo que deva ser extirpada, e não o seu contrário, ou seja, nutrida, preservada, acalentada.


A liberdade vem se constituindo, ao longo dos séculos, em uma das mais caras aquisições da humanidade. Não nos referimos à liberdade no sentido  filosófico do termo, àquela liberdade que o filósofo francês J. P. Sartre afirma, categoricamente, que todos nós temos, independentemente de qualquer contexto social, histórico e político. Nem à liberdade que T. Hobbes e J. J. Rousseau, afirmam ter existido quando os homens ainda viviam em um hipotético estado de natureza. Quando nos referimos à liberdade, o fazemos  na mesma perspectiva das pessoas do senso comum, ou seja, da forma mais pragmática possível. 


Não é incoerente presumir, que o motivo e a razão pela qual as pessoas se procuram, em diversos momentos da vida, sob as mais variadas formas, levando-as a ocuparem-se diariamente, com maior ou menor intensidade, uma das outras; seja, em última instância, a constante busca da felicidade. Se as coisas são assim de fato, nossas premissas iniciais nos conduzirão a uma conclusão inevitável: não há felicidade possível se, no mesmo contexto, houver deliberada  supressão da liberdade. Se faz parte do nosso projeto estar ao lado do outro e, concomitantemente, existe o desejo de que o outro também queira o mesmo de nós; se a esse fator decisivo for acrescentado: qualidades mil, profundidade e integralidade; não devemos ignorar que a concretização desse desejo só se tornará exequível se a espontaneidade, e, não a imposição, for tomada como paradigma fundamental das humanas relações. A espontaneidade, consequência direta da liberdade, empresta, sem melindres algum, substancial qualidade a qualquer tipo de relação que tenha como finalidade última, o bem comum. Até mesmo àquelas relações formais onde, por conta da hierarquia presente, as pessoas são mantidas relativamente afastadas (líderes e liderados de forma geral), não fogem à regra.


Levando tudo isso em consideração, surgem-nos perguntas: por que muitas pessoas no afã de ser e de ter o outro intimamente, temerariamente, abre mão, sem reserva alguma, da conquista mais cara de toda a história da humanidade? Por que o nefando pensamento de que a manutenção de qualquer resquício de liberdade, privacidade, autonomia e consciência de si, se mantém,  como potencial ameaça  para qualquer possibilidade de amizade, paixão, amor e credo religioso (havendo um rigor bem maior para as duas últimas situações)? 


Não são poucas as amigas e amigos que desabafam sobre o fato de terem suas vidas esmiuçadas ao máximo; sofrem acusações infundadas sobre pretensas traições; suportam o constrangimento de terem que produzir ininterruptas provas dos sentimentos que sabem possuir...


De um jeito ou de outro, muito mais pela intuição do que pela razão, todos nós sabemos como esses problemas começam; sabemos também sobre as múltiplas formas como eles se processam e, inevitavelmente, como a maioria terminam (ver: Regra Três, música de Vinícius de Morais no fim do texto). Todavia, desconhecemos à solução definitiva, quer seja para esse ou para qualquer outro tipo de problema de ordem emocional. Fugir das relações para não ter conflitos, problemas e frustrações, é o mesmo que colocar-se em um extremo. Os extremos, sejam eles quais forem, são, invariavelmente, perigosos. Nesses casos, fica valendo o ditado: “O remendo  saiu pior que a rotura”. 


A reflexão surge como possibilidade de compreensão relativa da dificuldade existencial do homem (a compreensão absoluta é quase impossível). Pensar e repensar valores. Defender e abrir mão de determinados princípios. Não oferecer tudo, para que amanhã não se descubra sem ter como, nem o quê negociar (lembre-se da fábula: O Pulo do Gato). Ser “econômico” no sorriso dos bons momentos, para que não restem somente lágrimas para os difíceis. Tudo isso surge como promissoras possibilidades, não como definitivas soluções. 

"O inferno são os outros", pensamento do filósofo Sartre. Cacau ":¬)



Identificada à doença, resta saber, com precisão, quem são os hospedeiros. Seriam aqueles que fazem do controle do outro suas marcas registradas? O, ao contrário, a única responsabilidade dessa mazela emocional, deve recair, tão somente, sobre os ombros daqueles que, inconsequentemente, se submetem a esse estado de coisa? Ou, a exemplo do que dizem os religiosos cristãos, diante desse tipo de “pecado” não há inocentes? Cacau “:¬)  
          
Regra Três
Tantas você fez que ela cansou
Porque você, rapaz
Abusou da regra três
Onde menos vale mais
Da primeira vez ela chorou
Mas resolveu ficar
É que os momentos felizes
Tinham deixado raízes no seu penar
Depois perdeu a esperança
Porque o perdão também cansa de perdoar
Tem sempre o dia em que a casa cai
Pois vai curtir seu deserto, vai.
Mas deixe a lâmpada acesa
Se algum dia a tristeza quiser entrar
E uma bebida por perto
Porque você pode estar certo que vai chorar

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